Ator e cineasta Bernardo Barreto
A arte é uma expressão profunda do ser humano, e aqueles envolvidos nesse campo frequentemente enfrentam desafios que testam sua resiliência e criatividade. Para inspirar aqueles que trabalham com arte, é fundamental refletir sobre a perspectiva de Bernardo Barreto, ator e cineasta, que destaca a importância da abertura dos sentidos como qualidades essenciais que promovem um ambiente criativo. Quando os artistas estão abertos e disponíveis, conseguem conectar-se mais profundamente consigo, com a obra e consequentemente com o público. No entanto, essa conexão pode ser comprometida pela pressão do mercado e pela superficialidade do mundo de hoje regido pelas mídias sociais, que muitas vezes priorizam a quantidade e velocidade em detrimento da profundidade. Para ajudar a manter essa autenticidade, Bernardo sugere exercícios sensoriais e meditações dinâmicas como ferramentas valiosas para o encontro do equilíbrio e reconexão da própria essência. “O ator precisa se conhecer antes de dar vida para qualquer personagem. Não acredito em nada criado que não venha de dentro, a imaginação é um processo secundário. Primeiro vem a substituição: as escolhas conscientes onde o ator emprega situações específicas da sua vida ao personagem, com o objetivo de criar uma partitura de memórias sensoriais”, divide Barreto.


Outro aspecto pulsante na trajetória artística de Bernardo é a interconexão entre a atuação e a escrita. Ele ressalta que sua motivação para escrever surge também a partir da sua necessidade de expressar as suas experiências como intérprete. “Acredito que escrever e atuar podem se complementar ou se potencializar.” Essa relação simbiótica não apenas enriquece suas criações, mas também reflete a jornada interna de quem atua. “A construção de personagens e o entendimento profundo da psicologia humana são fundamentais no desenvolvimento de narrativas ricas que vão além da superficialidade. O casamento entre a escrita e a atuação permite que os artistas se aprofundem em suas performances, gerando um envolvimento humano mais profundo e um entendimento melhor sobre a sua jornada como personagem.”
Na sétima arte, a atuação não é apenas uma técnica; é um processo que exige vulnerabilidade, disponibilidade emocional, e conhecimento sobre si (seu próprio instrumento). Manter o equilíbrio emocional é um grande desafio pela natureza da profissão que enfrenta rejeições constantemente. “O ator é um ser sensível por natureza, e grande parte do processo de luta por oportunidades e seleção para um papel está fora do seu controle. Normalmente gera muita ansiedade. Embora eu tenha aprendido a lidar com essas crises, não conheço uma cura, só tratamento”.
O ator e cineasta sempre demonstrou um profundo interesse por práticas de autoconhecimento, explorando métodos como a bioenergética, a meditação e o yoga. Essas experiências o levaram a transitar por comunidades alternativas, onde busca o equilíbrio e a sensibilidade necessárias para sua arte. Periodicamente, já passou temporadas em locais como a Osheanic, no Ceará, e na Humaniversity, no norte da Holanda. A temática aparece em seu filme “O Buscador (‘The Seeker),” estreado em 2019, no Tallin Black Nights Film Festival, um dos 12 maiores festivais do mundo, levando para casa, o prêmio do Júri de melhor filme. Além disso, o roteiro intitulado “Free Spirit”, outra obra como roteirista, reflete a história de uma comunidade itinerante de “buscadores”, uma turma paz e amor que acaba transformando a vida de uma cidade conservadora. “Nesse filme, a ideia é provocar um questionamento sobre como o medo de tudo que é diferente e o preconceito, mata o amor.”
Na sua visão, as práticas de bioenergética e meditação ativa servem para expandir a expressão física e emocional, encorajando a não se encolher diante das dificuldades que um sistema social “antinatural” frequentemente impõe. Ele enfatiza que essas terapias incentivam uma superação dos limites autoimpostos, uma possibilidade de encerrar e quebrar o “programa”, conduzindo a uma nova compreensão e autoconfiança fundamentadas. Segundo Bernardo, “Essas técnicas abrem o entendimento físico, o sensorial, e isso se reflete no mental. Ajudam a enxergar as travas, onde ficam os pontos cegos que nos fazem girar dentro de um programa de repetição. O segredo não está no controle, mas a partir do contato com o coração. Liberar os sentimentos trancados, com expressão, é o caminho para a liberdade emocional. Uma vez abri uma página aleatória de um livro de meditação e estava escrito: Não é para ler sobre, é para fazer a meditação”. Essa perspectiva sublinha a ideia de que a verdadeira conexão não está na cabeça. A autenticidade na atuação também provém da expressão genuína dos sentimentos, em vez de tentativas de controle que muitas vezes levam a escolhas limitadas.
Em meio às adversidades, Bernardo enfatiza que é a “organicidade da paixão” que serve como combustível. Para ele, essa chama interna está alinhada com seu propósito de vida, onde a vocação se torna uma questão de sobrevivência. “É quando a alma se encaixa ao meu propósito. É tudo o que eu tenho. Não é sobre manter a motivação, eu sou a motivação”. Em vez de depender de fontes externas de motivação, ele revela que a verdadeira inspiração vem de uma conexão genuína com o que se faz. Arriscar-se e sair da zona de conforto ao explorar novas experiências alimenta essa paixão e enriquece a criatividade.
As lições extraídas da visão de Bernardo Barreto ressaltam que os artistas são suas próprias ferramentas. A busca pela autenticidade na expressão artística e a vivência de experiências enriquecedoras não apenas ajudam a enfrentar os desafios, mas também transformam esses obstáculos em combustível criativo.
“Somos nossa própria ferramenta. O artista precisa saber acessar registros sensoriais do corpo, suas experiências emocionais, as mais profundas. Então, como diz a minha mestra, Suzan Batson: toda vez que se vive uma experiência, seja boa ruim, leve para a arte”.